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reagindo com emoji de foguinho

É engraçada a expressão “começou do nada”.
Todo começo é, literalmente, do nada.
Se não é do nada, começou antes.
Se esse “do nada” significa “sem motivo aparente” também está errado.
Se começou, houve algum motivo, a gente é que não sabe qual.
E quando o assunto é emoji de foguinho o motivo é um só: chamar atenção.
É um chamado pretensioso, porém discreto.
Não posiciona, mas também não compromete.
É um teaser.
Eu diria até que é minimalista – por assim dizer.
Numa época que a gente digita mais do que fala, o emoji é um atalho.
O problema é que o emoji de foguinho, se usado em excesso, é também um instrumento covarde. Oculta um sentimento.
Sem contar que é impessoal. Tem tudo pra virar paisagem.
Ele acoberta coisa que palavra revela.
E aí cria uma indefinição sobre intenção e reação.
Emoji de foguinho significa “se você quiser, eu quero”, mas também significa “que daora isso hein” e também significa um “vem aí”.
Vamos focar no significado “se você quiser, eu quero”.
Não há absolutamente nada de incorreto demonstrar intenção via emojis, mas é uma transferência de responsabilidade muito grande para um desenho.
Um dia foi o cartão pessoal com número de telefone, teve também a época de chamar para dançar na discoteca, hoje, é um emoji de foguinho.
Isso significa que o formato mudou mas o sentimento não.
Mas, talvez, a gente precise focar justamente no que não muda.
O impacto em alguém que recebe, sei lá, 6 palavras, por exemplo, tem tudo pra ser mais promissor do que de qualquer emoji.
Porque serão 6 palavras escolhidas.
Pensadas para aquele momento.
(ainda que sejam repetidas para outras pessoas).
Curioso imaginar o que é esperado que uma pessoa comente depois de receber um emoji de foguinho.
“Oie. Vamos sair sim, pode ser hoje 20h30?”
É impossível dizer que não se espera alguma reação que, não raro, são dois cliques no fogo que gera um coração artificial.
Isso quando não vem só um visualizado.
Para alguma coisa começar, é preciso ter intenção, ainda que não tenha segundas.
Se esperar a vida acontecer do nada, nada vai acontecer.

Márcio Rodrigues.
umtravesseiroparadois@gmail.com
@umtravesseiroparadois

de volta mas nunca para a estaca zero

Há uma confusão sobre a ideia de recomeços.
Não raro existe o desejo de deletar alguma coisa toda vez que recomeçar é necessário.
Um emprego. Um lugar. Uma pessoa.
Mas não há reinício que seja absoluto.
E isso não é exatamente negativo.
Ainda que o eventual recomeço não seja desejado, ele sempre vai partir de algum lugar percorrido.
Este lugar é cada dia que foi vivido.
A gente é uma coleção.
Muitos tênis já passaram pelos seus pés até existir o seu mais novo preferido.
O problema é buscar paixão.
O sentimento mais curto do mundo.
No trabalho, na casa e por alguém.
O que sobra depois que a paixão vai embora?
Sempre sobrou você.
Porque a gente é uma coleção.
Uma prateleira de sentimentos.
Em pensar que você tinha certeza que aquele amor de escola seria pra sempre.
Aí a gente quer recomeçar do zero.
Só que a graça de recomeçar é justamente não partir do zero.
É somar.
Há urgência em entender que recomeços são possíveis porque existiram começos.
E em cada um deles, você foi um você diferente.
No meio tempo entre um recomeço e outro muita coisa foi vivida.
Filmes, shows, viagens e pães pela manhã.
Mas lembrar raramente dá prazer.
O novo é o que dá.
Que você sempre possa voltar, mas nunca para a estaca zero.
Ainda que deseje, sempre vai ser, no mínimo, pela estaca um.
Que também nunca desperdice um recomeço.
A sua melhor versão só vai existir quando você lembrar do papel das outras.

🙂

Márcio Rodrigues.
umtravesseiroparadois@gmail.com

comecei a gostar das coisas que você gosta

Não faz sentido gostar desse tipo de filme.
Também nunca vi lógica essa predileção por sabor.
Muito menos dos dias frios.
E você também tinha opiniões controversas sobre as minhas preferências.
Eu considerava tudo isso uma desconexão e motivo para realinhamentos.
A gente precisaria achar um meio termo.
Mas o que achei foi um novo eu.
Ao me permitir conhecer mais de você, foi a mim quem eu conheci melhor.
O estranho é fácil demais de não gostar.
Tem a ver com o meu padrão sobre o que é bom.
Mas todo padrão é relativo.
Eu comecei a experimentar mais do seu mundo.
Assistir a pelo menos um filme inteiro.
Morder um pedaço.
Avaliar a parte boa dos dias de moletom.
Nada disso significou que eu mudei os meus gostos.
Eu só acrescentei um pouco dos seus.
Somar é sempre a conta mais fácil de fazer.
Eu abri mão de resistir.
Para me ligar mais a você eu precisava desligar minhas certezas.
Eu não perdi nada nesse processo. Pelo contrário.
Ganhei uma opinião para contribuir sempre que o assunto surgir.
Eu não preciso amar as coisas que você gosta para gostar de você.
Mas eu também não preciso desprezá-las.
A gente tem mania de privilegiar apenas o jeito em que nós vemos as coisas.
Desconforta saber que aquilo que gostamos é estranho para alguém.
Ainda que digamos que o que as pessoas dizem não importa.
Importa porque é sempre mais gostoso quando somos validados.
Experimentando um pouco das coisas que você gosta eu descobri coisas novas para gostar.
Os filmes tem papeis específicos nas nossas emoções.
Tem sabor que abre um portal no nosso paladar.
Dias frios melhoram a experiência de bebidas quentes.
Por isso eu comecei a gostar das coisas que você gosta.
Não porque você me pediu, nem porque eu me forcei.
Mas porque a única coisa que me custou foi tentar.
Tentar, muitas vezes, tem mais importância do que conseguir.
Agora, às vezes, a pizza de dois sabores pode ser de um só.
Mas tem certos filmes que sempre serão difíceis de engolir.

🙂

Márcio Rodrigues.
umtravesseiroparadois@gmail.com
@umtravesseiroparadois

mudar por dentro

Em pensar quem eu era.
Quem nós fomos.
Toda vez que eu pensei que seria para sempre.
As certezas que morreram.
E cada vontade que nasceu.
Sonho até virou plano.
O problema é que a gente quer uma pista de que as coisas vão acontecer.
Um fiapo de esperança para nos apegarmos.
É um saco esperar. A gente não vê a hora de chegar.
Muita coisa ainda não chegou.
Muitas outras chegaram e já foram.
Só que a gente não racionaliza e talvez tenha a ver com a vontade de querer mais.
Nunca está bom.
Você não me achou bom o suficiente para continuar e preferiu terminar.
Não aconteceu só uma vez.
E ouvir que o problema não era eu não me ajudou.
Eu sempre quis ter uma calma que não tem loja para comprar.
Vai ver tem a ver com as pistas que a gente busca só que misturado com a pressa.
Pressa em te esquecer.
Que vou acordar com as suas fotos deletadas do celular.
Pressa em saber que você não vai embora.
Que posso imaginar você me apontando uma paisagem pela janela do avião mais uma vez.
Saber que o nome é pressa já me ajuda a me acalmar.
É porque eu estou conseguindo mudar por dentro.
No livro do Direito do Consumidor não consta uma cláusula que permita devolver meu coração a meus pais por mau uso.
As pessoas só usaram.
Mas hoje eu entendi o valor para saber proteger.
Em pensar quem eu era.
Quando o poço é muito fundo não tem como ser otimista que a luz é a cura.
Eu nunca pensei em viver as coisas que já vivi e muito menos que viver tudo isso me deixaria ainda mais animado para viver.
Viver por mim primeiro, mas com quem amo por perto se eu puder pedir esse favor.
Enquanto houver amor o bastante para planejar e compartilhar.
Hoje eu não queria voltar para ontem.
É que hoje talvez o ontem nem era tão bom assim.
Lembrar que ontem tinha dor não facilita para o saldo ser amor.
É que talvez ontem nem tenha sido tão bom assim.
Ou tem mais ver com o fato de eu não ser mais a mesma pessoa.
Ou tudo isso junto.
Cansado de querer tanto, hoje eu estou bem só em querer e, especialmente, agradecer.
Chegar aqui me faz pensar onde eu posso chegar.
Não dá para saber ainda, mas estou em processo de mudança.
A começar por dentro.

por Márcio Rodrigues
umtravesseiroparadois@gmail.com
@umtravesseiroparadois

ainda não deu tempo de virar saudade

Por enquanto é um estranhamento.
Uma coisa que deixou de estar aqui.
Um quadro torto entre os alinhados.
Meia ímpar.
Controle remoto que funcionava até ontem.
Não sei quem determina quando uma coisa é recente, mas ainda é presente.
Você não está mais aqui.
Não te ouço reclamar que o delivery veio errado.
Nem da minha demora em me arrumar.
E também não ouço mais sua risada com um vídeo engraçado no celular.
Mas ainda não deu tempo de transformar sua falta em saudade.
E talvez eu não esteja pronto pra normalizar.

Ter a sua falta ainda é sinal de ter um pouco de você.
Talvez não tenha lógica que explique isso.
Mas é uma negociação emocional com a esperança de ver isso mudar.
Mas também não sei de qual tipo de mudança estou falando.

Acordar amanhã e lembrar de também te acordar como me pediu.
Viver o dia como ontem.

Eu devia ter pressa em pular para o próximo momento bom da minha vida depois de você.
Mas não há um botão que me ajuda a acelerar.
E vai ver a última coisa que eu tenho agora é pressa em te esquecer.
Porque sentir a sua falta é o que sobrou de você.
É a última ligação entre nós.
Uma despedida solitária, lenta e silenciosa incentivada por rituais.
Parar de te seguir.
Deletar a nossa conversa.
Reorganizar fotos no celular.
Torcer por você mas não buscar notícias suas.
Porque a manchete da minha vida revela que não apenas penso em você, como ainda não quero parar de pensar.
Eu até saio de casa bem, mas o problema é voltar.
Sua ausência faz barulho demais.
E não deu tempo de me fazer mal.
É mais um pouco de você.

por Márcio Rodrigues
umtravesseiroparadois@gmail.com
@umtravesseiroparadois

eu tive a intenção

Boa parte das vezes é sem.
Mas outra boa parte é repleta.
De intenção.
Quando contei que gostei, o plano era evitar suas dúvidas.
Quando perguntei se a gente poderia se ver de novo.
A minha intenção era dizer que estava cedo para acabar.
Te perguntar se quer algo do supermercado.
Para saber se algo de lá vai te fazer bem.
Como que foi no trabalho?
Me conta para você ver que não foi coisa da sua cabeça sentir o que sentiu.
Te mandar um vídeo no TikTok de uma paisagem na europa.
Vai que você anima.
Vídeo de bicho para você dar risada alta no quarto.
Colocar uma música que te empolga.
Só para garantir um momento bom no começo do dia.
Lugar novo para comer ou comer no lugar de sempre.
Descobrir ou confortar. Coisas que o coração gosta.
Quando menciono o tempo juntos é pra gente lembrar do que já passamos.
E de como passou tão pouco perto de tanto por passar.
Cliquei duas vezes numa foto sua e apareceu um coração na tela.
Se você for do tipo que não desativa notificação, vai aparecer um aviso de que eu gostei.
Um beijo para começar e terminar o dia pra eu saber que há e houve você.
Deslizei o teclado de emojis algumas páginas até encontrar o que eu queria.
Pra você saber que procurei um pra escolher.
Boa parte é com intenção; exclusivamente as boas.
Antes de dormir, pego o carregador do celular sem você pedir.
Pra você não acordar brava por esquecer.
Desvirar o chinelo.
Tem um montão de coisa que a gente não repara porque a gente espera que nos contem que precisamos reparar.
A gente repara quando fica óbvio que é intencional.
Vestir roupa chique pra prometer que é pra sempre.
A volta do cabeleireiro ou do barbeiro.
“adorei!”
Antes da viagem que acontece uma vez por ano a gente vive um ano.
Talvez a gente só não repare; quanta coisa cabe.
Cada intenção é um tijolinho. Vai virar casa pra chamar de ninho.

por Márcio Rodrigues.
@umtravesseiroparadois


me avisa quando chegar em casa?

Me avisa primeiro pela segurança.
Depois para eu te contar minha opinião sobre nosso dia.
Mesmo que eu tenha te contado pessoalmente antes da gente se despedir.
Coisa boa fica melhor ao repetir.
Me avisa para eu te contar como foi o meu caminho na volta.
Habitualmente desinteressante, mas sempre incrível depois que conheci você.
O semáforo nem demora mais tanto assim.
A rádio, do nada, agora toca sempre as melhores.
Eu ganho no sorteio de posição da porta quando o metrô para.
O delivery chega rápido.
Essas coisas.
Tudo depois de você.
E me avisa para eu saber de você.
Para eu te ler – ou ouvir seus áudios que odeia enviar – sobre seus planos para as próximas horas.
(apesar de eu já saber que você planeja continuar aquela série)
A gente está vivendo aquela fase de achar graça em coisa sem graça.
E talvez essa seja graça.
Ter consciência disso pode proteger o que a gente sente.
Me avisa quando chegar em casa para eu te contar que você não sabe brincar ao me fazer elogios que eu só lia nos livros.
E para eu te contar que não poupo energia para te mostrar que eu não quero que a gente acabe.
Que maluquice a gente.
Até poucos dias ninguém me contava quando chegava em casa.
Até porque não havia ninguém para me contar.
E hoje tem você.
E tem também o seu puxão de orelha quando sou eu quem esquece de avisar.
A gente tá decodificando como gostar de alguém é óbvio.
E concluindo que o óbvio é tudo o que importa.
Se todo dia for óbvio te ouvir que gosta de mim, eu nunca vou reclamar.
Perceber uma pessoa estranha se transformando íntima na nossa vida.
E tudo isso rápido pra quem vê de fora.
Tudo num espaço de tempo que o relógio não consegue medir.
O coração, sim.
O coração é o relógio do sentimento.
Ele vai me avisando ao longo da semana quando a gente vai se ver.
Estou almoçando e PLAU, coração acelera para me avisar.
Me avisa desde a hora que acordo até quando estou a caminho de você.
E, além de me avisar, o coração me lembra, depois da gente se despedir, como foi bom te ver enquanto dou risada para o celular te pedindo para avisar quando chegar em casa.

não aparece ninguém ou eu que procuro você em quem aparece?

Eu notei que venho reclamando para os meus amigos.
“Ninguém presta”, “só conheço gente sem graça”.
Durante um tempo avaliei se não era um elevado padrão de cobrança.
Existe um certo padrão desejável por mim, é bem verdade. O que não sei se é verdade é se sou o padrão para alguém.
Eu acho que tem um pouco disso, sim.
Eu prefiro um determinado perfil. E não me cobro exatamente por isso.
Todo mundo têm perfis prediletos – pelo menos em teoria.
Porque acontece muito de aparecer alguém que quebra com qualquer lógica, né? Teorias falham.

Nessa jornada de conhecer pessoas depois de você, eu fui descobrindo outras versões de mim.
Isso tem a ver com aquele cansativo processo de recomeçar a conhecer alguém.
Saber do que gosta, do que não gosta. Qual o tamanho dos sonhos. O sabor de pastel. A série que não poderia acabar. A música que não sei da playlist. Essas coisas e todas as outras que envolvem o processo de conhecer alguém.
Eu não tinha muito o que fazer a não ser sempre recomeçar.
Quando uma história dava uma esfriada o bastante para não existir mais, eu voltava para o começo ao encontrar uma nova pessoa.
Passou a me incomodar, porém, o quanto eu não avançava.
Aumentava a impressão de que se tratavam de pessoas parecidas demais e que não exatamente me empolgavam o bastante para eu dedicar toda a minha energia.
Mas o problema nunca esteve nessas pessoas.
O problema está em mim.

Eu fui notando que não gostava da risada porque a sua era incomparável.
Eu não gostava do ponto de vista porque o seu era sempre ponderado e profundo.
Percebi que não gostava tanto do beijo porque o seu não dava vontade de parar.
Passei a evitar ideias de assistir a filmes em casa porque no sofá tinha um lugar seu.


No fim das contas eu passei a conhecer pessoas procurando você em alguma parte delas. É como se eu mapeasse a pessoa em busca de pistas suas. Queria ouvir o seu som de risada. Queria o seu jeito de opinar. Queria o seu jeito de tocar o meu rosto ao fim do beijo. Queria você buscando pipocas caídas no sofá com o filme pausado.

Eu não tenho sido uma boa pessoa para ser uma pessoa boa para alguém.
Ninguém que eu conheci tem culpa de como estou sendo.
Acho que tem a ver com a minha pressa em organizar um lugar na minha vida para você e não precisar encontrar mais. Pressa em te superar.

Senti tanta pressa de virar a página que escrevemos que passei a rasgar todas as próximas.

Apareceu tanta gente legal, mas como não encontrei você nelas, eu desanimei.

Reconhecer isso pode ser o primeiro passo para eu mudar.
E também te mudar de lugar na minha vida; deslocando do presente para o passado para encontrar um espaço só meu para o futuro.

por Márcio Rodrigues
@umtravesseiroparadois
umtravesseiroparadois@gmail.com

a primeira pessoa para quem eu conto tudo

Muito trânsito no caminho do trabalho.
Um emoji quando não posso falar muito.
Foto do almoço para provar que estou tentando comer saudável.
Foto do sol que estava bonito quando a tarde estava acabando.
Um print de meme.
O post de um show do artista que você me disse gostar.
Foto da TV explicando minha dúvida sobre qual filme assistir.
O constrangimento no elevador com o chefe.
O estado do dedo depois de chutar a quina da mesa.
Print do grupo da minha família.
Comprovante dos ingressos do filme que vamos ver no cinema.
Foto do absurdo que está o preço do azeite.
Um vídeo do TikTok de 2minutos sobre aquele livro que você falou.
Quando me sondaram para uma vaga de emprego.
Quando consegui um emprego novo.
E quando não me escolheram.
Foto para provar que estou fazendo exercício físico.

Você é a primeira pessoa para quem eu conto tudo.
E eu fui notando isso sem calcular.
De início parecia um jeito de puxar de conversa, depois passou a ser uma necessidade.
Tem vezes que a necessidade é só te fazer dar alguma risada.
Em outras é te avisar de algo que talvez não tenha visto.
Em muitas é desabafar.
Em todas eu me sinto bem.
Em todas me sinto amparado e eu não lembrava como é bom me sentir assim.
Gosto de te convidar para os micros momentos da vida.
E isso não significa que você precisa ser do mesmo jeito que eu; isso é sobre mim.

Quando eu percebi que você passou a ser primeira pessoa para quem eu conto tudo, eu entendi como tudo passou a me empolgar.
E aí não foi “do nada”.
Foi porque existe você. E é gostoso falar de tudo com você.
Você reage aos meus assuntos.
Pergunta sobre o meu sentimento.
Se disponibiliza para me ouvir ou para qualquer tipo de ajuda.
Me encoraja a tomar decisões que eu hesito.
Não passa pano quando a sua opinião é que eu errei.
Sente raiva junto comigo.
Fica feliz por mim.

A primeira pessoa para que eu conto tudo, também é a pessoa cuja eu mais posso contar para tudo.

por Márcio Rodrigues
umtravesseiroaradois@gmail.com

talvez não seja sobre te esquecer

Eu posso deixar te seguir nas redes sociais.
Deletar nossa conversa no WhatsApp.
Apagar suas fotos.
Parar de ouvir músicas que me lembram você.
Evitar tudo mais que eu sei que você gosta.
Mas talvez não seja sobre te esquecer.

Eu fui me descobrindo enquanto fui conhecendo você.

Descobri que eu consigo surpreender a mim mesmo; que eu posso demonstrar que gosto de alguém de maneiras um tanto quanto imprevisíveis até pra mim. Eu gosto de gostar de alguém e não meço meu esforço para que a pessoa saiba disso. Tem gente que prefere não aparentar tanto.

Eu entendi um pouco melhor o que significam limites também.
Limite é quando o motivo amarela o nosso sorriso.
Demorei para perceber que as minhas respostas de ‘tudo bem e com você?’ nem sempre estavam bem assim.
Tem a ver com um jeito de falar meio atravessado.
Uma impaciência para ouvir.
Desinteresse em perguntar.
Alguma displicência com combinados.
Eram coisas pontuais. (eram?)
Daí passou a ser rotina tanta coisa pontual.
Principalmente porque as coisas oficialmente boas se tornaram escassas demais para equilibrar.

Entendi uma outra coisa muito importante também: o apetite por planos deve ser compartilhado.

Eu te contava coisas que eu gostava ou queria fazer; viagens, músicas, passeios ou até filmes que eu gostaria de assistir, mas você nunca me devolveu animação convincente. Foram poucas as vezes que eu não te acompanhei em algo que era desejo mais seu do que meu. Eu percebi que talvez você quisesse ter uma relação centralizada nas suas preferências e não na de duas pessoas.

Mesmo assim, talvez não seja sobre te esquecer mesmo.
Primeiro porque acho que não tem um botão pra isso.
O tempo vai te acomodar na minha vida num lugar que vai ficar difícil de acessar aos poucos. Quando eu menos perceber, você já não vai ser uma das primeiras coisas que vou pensar.
E, segundo, porque ter consciência de que você existiu na minha vida é um jeito de me fazer pensar em tudo o que descobri sobre mim ao te conhecer.

Eu que pensava que me conhecia, descobri que sei tão pouco sobre mim. (será que um dia a gente descobre tudo sobre a gente?)
E talvez seja essa a graça de ter uma relação com alguém, né?
Um clichê dos grandes.
Conhecer alguém e, ao mesmo tempo, conhecer mais de nós mesmos, novas versões de nós mesmos, avaliar como a gente muda de ideia, de certeza, de preferência e de visão micro ou macro sobre as coisas. Bobagem demais acreditar que nunca dá tempo para mudar.

Eu posso deixar de ter seguir nas redes sociais.
Eu vou encontrar maneiras de não ficar pensando em você, mas isso não significa que preciso te esquecer.

Eu só preciso lembrar mais de tudo o que descobri sobre mim depois de te conhecer.

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Márcio Rodrigues
@umtravesseiroparadois
umtravesseiroparadois@gmail.com

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