A impressão é que, ao nascer, ganhei um manual de instruções sobre como eu funcionaria.
O problema é que o sigo até hoje.
E isso me faz ser previsível demais.
E cansativo de aguentar a mim mesmo.

Eu li os textos e assisti aos filmes que alertam sobre os perigos de se apegar, mas eu sigo me apegando quando alguém retribui o meu menor sinal de interesse.

Eu entendo a importância de “deixar as coisas irem devagar”, mas eu sigo gostando de me dedicar mil por cento apesar de ainda estar conhecendo alguém.

Também acho que faz sentido a possibilidade de assustar alguém ao parecer meio grude, mas eu sigo gostando de deixar claro que a pessoa que começa uma história comigo, se depender de mim, tem tudo pra ser a última.

E tudo isso tem uma explicação: eu sinto muito.

Sinto tanta coisa e com tanta força e eu sou o primeiro a me incomodar.
É chato a ponto de me irritar quando percebo que a minha barriga começa a esfriar ao receber uma mensagem de alguém que estou apenas conhecendo. Eu não calculo a velocidade com a qual gosto de alguém, eu sou atropelado por ela.

Me vejo ridículo rindo feito bobo ao contar de alguém que estou saindo para algum amigo. É que eu gosto de falar que estou gostando.

Se eu pensar bem, também é desnecessária a minha obsessão com as músicas que uma pessoa que estou interessando me indica para ouvir; na minha cabeça, é um jeito de conhecer um pouco mais do mundo daquela pessoa.

Talvez esse seja o ponto: eu não penso bem.

E não penso bem porque eu sinto muito.
Sinto mais do que penso e quando sinto que é preciso pensar bem eu desisto; eu não consigo.

Fracasso em todas as tentativas de me inspirar em pessoas menos intensas; aquelas pessoas que conseguem ser frias o bastante para decodificar o exato sentimento e o tempo certo de dar nomes para as coisas. Eu fracasso porque, pra mim, quando sinto que alguém está entrando na minha rotina e me fazendo bem, eu já gosto de imaginar que o próximo fim de semana vai ter a presença dessa pessoa.

É bem verdade que, como eu disse, sentir tanto assim me deixa exausto.
Exausto de recomeços, de conhecer e ser conhecido por alguém; exausto de ciclos. Eu falo muito sério quando digo que gostaria de levar um pouco de calma para o meu coração, mas eu não consigo controlar.

Alguém consegue?
Ou muita gente só finge?
Ou é só tentativa de parecer uma pessoa durona e que se envolve devagar?
Porque é cool parecer sério, né?
Contar na terapia que aprendeu “o tempo certo das coisas”?

Acho que esse é outro ponto: não consigo mentir, muito menos disfarçar – na verdade, nem é meu interesse.
Quem está comigo vai saber exatamente como estou me sentindo, o que estou sentindo e o quanto sinto pelo que temos. Quem está comigo não vai ter dúvidas de que estou gostando porque, ao invés de pistas, eu dou provas. Você vai saber o bem que me faz. Você vai saber que estou com saudade. Você vai saber que me inspira. Você vai saber que eu te admiro e te respeito. Você vai saber que me ensina. Você vai saber que eu gostaria de ter nos meus planos – vai saber que faço planos. Vai saber que fiquei triste por errar.

E tudo isso porque eu sinto. Muito.
E, sentindo tanto, talvez seja essa a conclusão: o mesmo eu que me cansa, me empolga. Chega uma hora na vida que não dá mais para tentar mudar assim drasticamente. Aquele manual que me deram virou tatuagem e, na rotina de sentir tanto assim, o desafio é aprender a conviver bem comigo antes de alguém conviver com a minha companhia.

Eu sinto muito mas não é pra menos: eu sou feito do que eu sinto.

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por Márcio Rodrigues
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